Orientações Psicoeducativas - cuidadores de pessoas com Demência


Os comportamentos associados às pessoas com demência (Perturbação Neurocognitiva Major) e que se apresentam como desajustados e problemáticos na dinâmica das famílias podem ser variados, como por exemplo os comportamentos de apatia, de agressividade, de irritabilidade, de raiva, de ansiedade, de medo, de esconder e perder objetos, de acusação e ofensa, de reações exaltadas, de frustração e tristeza, de perguntar repetidamente a mesma coisa, de deambulação, de perseguição, entres outros. Estes comportamentos assumem, por norma, aspetos muito particulares que estão relacionados com a forma como cada pessoa expressa a doença e à forma como cada membro da família e a família enquanto grupo lidam com a doença e com as situações; o que torna difícil apresentar orientações que se revelem adequadas para todos os pacientes e eficazes para todos os cuidadores e famílias, mesmo quando estamos a falar do “mesmo” comportamento. Neste sentido, destaca-se a importância da caracterização do comportamento e da situação em que o comportamento ocorre. Para tal, podemos sempre considerar cinco questões sobre o comportamento identificado como “problema” e no qual queremos intervir:

O que acontece antes do comportamento?
Ao responder a esta questão, podemos identificar uma situação ou um evento que esteja a ser desencadeador do comportamento em que queremos intervir e a partir do momento em que se identifica esse “gatilho”, existe logo a possibilidade do comportamento ser anulado ou diminuído na frequência e/ou na intensidade da sua ocorrência. Exemplos: o cuidador principal ausenta-se, existem várias pessoas desconhecidas ou que não sendo desconhecidas não são presença habitual junto da pessoa com demência, a pessoa com demência foi confrontada, ficou sozinha, etc.

Quando é que o comportamento ocorre?
Podemos estar a falar de um comportamento que apenas ocorre à noite, logo ao acordar, na hora das refeições, … ou que ocorre em vários momentos do dia. O saber quando acontece o comportamento permite-nos adequar a resposta para fazer face ao comportamento sobre o qual queremos intervir. Por exemplo: a resposta face ao comportamento de deambulação noturna, não será a mesma se o comportamento de deambulação for diurno.

Onde ocorre o comportamento?
O comportamento identificado como problema pode surgir contextualizado pelo lugar em que ocorre, por exemplo, numa casa de férias ou numa outra habitação que não seja residência habitual da pessoa com demência, no hospital, na rua, no hipermercado, no carro, … perceber-se a existência ou não de uma associação ao lugar, permite enquadrar o comportamento num contexto e às suas características, o que, em si mesmo, ajudará a intervir na mudança do comportamento ou da situação problema.

Como evolui o comportamento no momento em que ocorre?
Com esta questão, procura-se perceber se o comportamento sobre o qual queremos intervir desenvolve-se sempre da mesma forma ou não. Isto é, sempre que o dito comportamento surge, acontece com a mesma intensidade ou dentro da situação acentua-se ou diminui a sua intensidade, o comportamento quando ocorre é único/isolado ou é combinado com outros comportamentos identificados como desajustados, …. Por exemplo: a pessoa com demência grita, no momento em que grita, fá-lo cada vez mais alto ou à medida que grita vai baixando o volume; ou quando grita, apenas grita ou grita, dá pontapés nas mobílias e arremessa objetos. Descrever a evolução do comportamento no momento ou na situação em que ocorre dá-nos a possibilidade de acalmar e de suavizar esses momentos.

O que acontece após o comportamento (consequências)?
Face ao comportamento identificado é importante observar o que acontece à posteriori, ou seja, como fica a pessoa com demência, como se sente, o que faz após a manifestação do comportamento e o mesmo para o cuidador e para os familiares que coabitam, como se sentem, como reagem e o que fazem perante a situação, quais as consequências para o cuidador e para a família (e.g., sobrecarga de trabalho com limpezas e/ou arrumações, …) e as consequências no ambiente (e.g., existem estragos, alguma situação de risco, …). Atender e recolher este tipo de informação, possibilita-nos agir sobre a minimização do impacto do comportamento na pessoa com demência, nas pessoas com quem coabita e no ambiente. Além disso, também permite ajustar comportamentos reativos face ao comportamento identificado como problema, evitando “gatilhos” para outros comportamentos desajustados.

É possível que para algum ou alguns comportamentos e situações não seja fácil responder às cinco questões, mas importa, pelo menos, levá-las em conta na hora de descrever o comportamento que identifica como problema e todo o enquadramento que o envolve. Por um lado, porque poderá por si próprio/própria ou em família encontrar uma forma de ultrapassar a situação ou de a minimizar, aliviando a vivência desses momentos para todos. Por outro lado, mesmo que não consiga ultrapassar a situação sozinho/sozinha ou em família, terá sempre melhores condições de obter uma resposta mais ajustada e eficiente para o seu caso em particular, por parte de um profissional, porque tem a informação organizada ou pelo menos agrupada.

Espero que tenha sido um tema do seu interesse e que de alguma forma lhe possa ser útil.

Dra. Dulcineia Boto, Cédula Profissional nr. 14875